terça-feira, 28 de maio de 2013

Paul Krugman Vê Portugal a Viver "Um Pesadelo"

Paul Krugman-O economista Paul Krugman abordou o tema Portugal no seu blog do jornal The New York Times para se referir à situação do país como um pesadelo. O Nobel da Economia pega no exemplo português para mandar um recado aos decisores da União Europeia: ou o euro desaparece ou se faz alguma coisa para que resulte. O que não pode acontecer – sustenta Krugman – é que se permita a destruição das unidades familiares de negócio, “o núcleo da economia e da estrutura social”, condenando “um extenso número de trabalhadores ao desemprego”.


Não é a primeira vez que Paul Krugman se refere à situação portuguesa. Há um ano manifestava fortes dúvidas de que Portugal conseguisse pagar a sua dívida por inteiro.

Desta vez vai mais longe e fala do pesadelo económico-financeiro que o país vive, para se lançar na defesa de soluções que não passam pelas políticas de austeridade a que tem deitado mão a liderança da União Europeia.

“Não me digam que Portugal tem tido más políticas no passado e que tem profundos problemas estruturais. Claro que tem: como todos os outros têm, mas, sendo a situação portuguesa mais grave do que noutros países, como é que pode fazer sentido lidar com esses problemas condenando ao desemprego um grande número de trabalhadores disponíveis?
 
”Há mês e meio o estudo seria posto em causa por um estudante de doutoramento. Problemas que obrigaram os autores a publicar uma correção desse estudo, mas cuja tese central – a ideia de que é impossível crescer com dívidas superiores a 90% do PIB - não mais foi vista da mesma forma.

A controvérsia em torno do estudo Crescimento em Tempos de Dívida abriu em definitivo a porta à contestação das políticas de austeridade.

Krugman foi igualmente crítico desse estudo e questionou, de forma retórica, se terão Keneth Rogoff e Carmen Reinhart “destruído por completo a economia do Ocidente?”.

“De facto, Reinhart-Rogoff poderão ter tido uma enorme influência, imediata, no debate público do que qualquer outro estudo na área da Economia”, insistiu Krugman, palavras que lhe mereceram um contra-ataque duríssimo numa carta publicada há dois dias pelos dois economistas.

Paul Krugman, acrescentam os dois autores, teve um comportamento pouco civilizado ao querer transformá-los em bodes expiatórios da situação que se vive em boa parte do Ocidente, com a implementação a toda a força de políticas de austeridade. Mas não apenas nesse departamento, também quando lançou acusações de que não partilhavam os seus dados ou ignorando estudo que vão ao encontro das suas conclusões em Crescimento em Tempos de Dívida.

R&R voltaram a repetir argumentos que têm esgrimido nos últimos tempos, procurando, em termos genéricos, desmentir a ideia de que a sua teoria estabeleça uma relação de causalidade entre forte dívida e baixo crescimento. Explicam que o que fica demonstrado é a relação (association, no original) entre uma coisa e outra. 
 
É a questão deixada por Krugman.Logo de entrada, o Nobel da Economia de 2008 aponta a degradação dos negócios familiares - que vê como o núcleo quer económico quer social do país – para pintar um quadro “profundamente deprimente” do Portugal destes tempos. Mas não se trata de um mero exemplo ilustrativo. Para Paul Krugman, “[contrariar isto] é o que de facto interessa”.Devemos tentar perceber "como e porque é que estamos a permitir que este pesadelo aconteça de novo, três gerações depois da Grande Depressão".
A solução, sustenta, está numa política monetária e orçamental expansionista que Portugal não pode colocar em marcha, já que “deixou de ter moeda própria”. E é neste ponto que o economista norte-americano advoga uma decisão: ou o euro acaba ou se faz alguma coisa para o pôr a funcionar.
 
“Porque aquilo a que estamos a assistir (aquilo por que os portugueses estão a passar) é inaceitável”, acrescenta Krugman, defendendo que a solução deve passar por “uma expansão mais forte na zona do euro como um todo e uma inflação mais elevada no núcleo europeu”. Para o conseguir, uma política monetária menos apertada seria uma ajuda, “tendo em mente que o BCE (Banco Central Europeu), tal como a Fed (Reserva Federal Norte-Americana), são contra taxas de juro próximas de zero”. Neste sentido, acrescenta, são desejáveis “políticas não convencionais (…) e uma ajuda ao nível da política orçamental”.

O que Paul Krugman rejeita liminarmente é a solução na continuidade do que vêm sendo os últimos três anos de uma política europeia “focada quase inteiramente nos supostos perigos da dívida pública”, com “a austeridade na periferia a ser reforçada pela austeridade no centro”.
É uma visão que o Nobel norte-americano teme venha a ser comentada como a de um anti-europeu. Nada disso – garante. Num segundo texto colocado logo após no seu blog “Consciência de Um Liberal”, Paul Krugman afirma que por vezes encontra europeus que vêem nas suas críticas à troika a opinião de “um anti-europeu”.

“Pelo contrário: o projecto europeu, a construção da paz, democracia, e a prosperidade através da união, é uma das melhores coisas que aconteceu à Humanidade. É por isso que estas políticas erradas, que estão a rasgar a Europa em bocados, são uma tragédia tão grande”, explica nesse texto que aborda a sua passagem por Portugal no período pós-revolução (1975) enquanto conselheiro do MIT (Massachusetts Institute of Technology), a pedido do então governador do Banco de Portugal José da Silva Lopes.
 
O economista lembra com ironia que entre os especialistas que se deslocaram a Portugal nesse período que se seguiu ao derrube da ditadura de Marcello Caetano estaria um ano depois Ken Rogoff, um colega com quem tem mantido um diferendo académico, depois da polémica acesa a propósito de uma certa teoria da austeridade alegadamente sustentada numa folha de Excel suspeita.

Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, economistas da Universidade de Harvard e com ligações ao FMI (Fundo Monetário Internacional), têm estado no centro de todas as discussões sobre as políticas da austeridade devido a Crescimento em Tempos de Dívida, obra de 2010 sobre o impacto da dívida pública no crescimento económico que tem sido vista como uma espécie de cartilha para neoliberais.